DIA NACIONAL
DA CULTURA
Mtº Marum
Alexander
Hoje se comemora, em todo o Brasil, o Dia Nacional da
Cultura.
O Dia Nacional da Cultura foi instituído por meio da Lei
Federal nº 5.579, de 19 de maio de 1970, e celebra o nascimento de um dos mais
importantes personagens da História do Brasil: Rui
Barbosa, intelectual, jurista, político e jornalista, que nasceu em 5 de
novembro de 1849.
Como
presidente da Academia Ubaense de Letras e como homem sempre voltado para as
coisas da arte e da cultura, não posso me furtar a discorrer um pouco sobre
este tema tão abrangente.
O binômio “arte-cultura” tem sido muitas vezes
menosprezado pelo povo; e este tende a considerar a arte como um luxo e não
como uma forma pura de manifestação do espírito criador de cada um, com sua
sensibilidade própria e sua maneira característica de transmiti-la.
A arte, na
sua plenitude, busca a cultura como fim último.
Não
considerada, entretanto, como um problema prioritário até há pouco tempo atrás,
a cultura ficou bastante sacrificada em nosso país.
Assim sendo,
as nossas realizações artístico-culturais, com suas necessidades financeiras,
mercado restrito, carência de mão-de-obra especializada, etc., vêm sendo, cada
vez mais, sacrificadas pela criação entre nós de um círculo vicioso e
constante: ou a permanência de nosso artista em condições de precária
sobrevivência, ou o seu êxodo para outras terras, desfalcando culturalmente os
nossos meios ¾ particularmente o de Minas
Gerais, que é tido e havido como o maior manancial do país nesta área
específica.
Dessa
assertiva incontestável uma conclusão pode-se tirar: é preciso concentrar todos
os esforços na aculturação da criança e do jovem brasileiros, pois neles é que
está a base de todo o entendimento, sedimentação e difusão de uma verdadeira
vida cultural futura.
Em todos os países do mundo a criança é, antes de
tudo, a preocupação maior de qualquer governo, porque nela devem, de fato,
concentrar-se todos os esforços culturais e recreativos para transformá-la num
futuro cidadão da Pátria, tranqüilo, ordenado, alegre e cioso, quando se tratar
do dever maior da missão comum de servir à Nação, de contribuir, em todos os
campos da cultura e da ciência, para o seu desenvolvimento, sua grandeza e sua
união.
Já se tornou um axioma popular dizer-se que ‘com o sorriso de uma criança se constrói a
felicidade do homem de amanhã’.
No mundo de hoje, em que a lógica cada vez mais vai
perdendo os seus direitos, surgiu, como profunda verdade, um sentimento novo: a
preocupação da juventude com as coisas de sua época. O seu despertar, voltado
para as riquezas arquitetônicas, sociais e culturais, pode ser considerado
também como um autêntico nacionalismo.
Explorar, congregar, valorizar e difundir o potencial
da juventude brasileira é, e será sempre, uma arte delicada e minuciosa, que
muitos não conseguem realmente compreender.
A facilidade de transporte no mundo atual
praticamente aboliu as fronteiras entre os homens de todas as raças.
As viagens incessantes dos grandes mestres, as
migrações dos criadores e teóricos que acompanham até mesmo os seus protetores
em todas as direções, a emulação que se estabelece entre as diferentes nações,
rivais em riqueza artística, cultural, fabril, cientifica ou arquitetônica,
beneficiam o mundo com uma esplêndida descentralização.
Como resultado de estarem pondo em comum as suas
aquisições, invenções e descobertas, de compararem as suas técnicas e de
divulgarem os seus métodos, os homens – servindo de exemplo aos jovens –
caminham para dar à sua linguagem um caráter de acentuada universalidade. Mais
uma vez se verifica, assim, a permanência da lei que submete o gênio criador à
servidão da matéria.
Assim é que também o Brasil moderno é um Brasil de
jovens. Estamos entrando numa nova era em que os valores antigos são
substituídos pelos novos, na busca de uma sociedade ideal. E esta sociedade se
delineia cada vez mais, formada de elementos atuantes, cheios de vida. Eles
estão aí, tomando conta de tudo com seu ar aparentemente desleixado, com suas
roupas coloridas... As correntes de opiniões se formam para julgá-los: muitos
condenam, muitos absolvem. E nós, que tomamos uma posição de cultura no
contexto, como ficamos? Não, não é esta a sua verdadeira imagem, pois é muito
simples verificar-se que, debaixo dessa enganosa postura, há muita estória para
ser contada e, principalmente, muita coisa para ser imitada.
É como disse
Pascal: “Toda vida humana não é mais que
uma imagem da vida da humanidade inteira”.
Em face disto, estaremos sempre lançando um apelo à
nossa gente: cultivar e desenvolver cada vez mais a educação da criança
brasileira, pelo exercício constante de todas as suas faculdades, a fim de
torná-la mais apta para a vida, porque nela se resumem todas as esperanças
futuras de nosso País.
No entanto, nunca é demais lembrar que a educação
deve pretender formar a criança de uma maneira determinada. Se o fim da
educação é distinto, compreende-se que os princípios pedagógicos possam variar;
e ainda quando a finalidade fosse a mesma, os princípios da educação também
poderiam ser distintos, se a época, a raça, o meio social e o caráter fossem
diversos.
E sabe-se também que no mesmo País e na mesma época
os procedimentos educativos variam segundo se queira formar um indivíduo, desde
a infância, capaz numa especialidade ou em outra.
Em todas as etapas da educação, entretanto, o ser
humano necessita de sua inteligência, de sua vontade, de seu sentimento e de
sua parte corporal; pois não se deve esquecer que a educação deve ser completa
e simultânea em todos os aspectos, conjuntamente com a parte física. Não
somente pela influência mútua que têm, como também porque estas separações
científicas se referem a uma individualidade indivisível.
Estamos todos de acordo em que a faculdade criativa é
uma parte da educação, que dá à criança e ao jovem o poder adicional da
sensibilidade — e que esta forma de cultura constitui parte legítima do
trabalho escolar.
Por isso, as razões que geralmente se citam em favor
da cultura abrangente, como parte da educação comum, são, principalmente, a de
que ela funciona como matéria agradável para o descanso de outros estudos, como
conhecimento que deve formar parte da educação geral; como meio de cultura
estética, preventivo de um mau gosto generalizado; e, ainda, para descobrir
nela valores ou disposições especiais que, no caso, devem ser estimuladas pelos
pais e pelos mestres.
Como matéria agradável para o descanso de outros
estudos (se é verdade que um trabalho serve de descanso a outro), a cultura
abrangente, por sua natureza, será mais eficaz neste sentido que outra matéria
qualquer.
Os esforços da cultura e da arte para descobrir a
novas realidades sociais foram temporariamente inibidos pela burocracia; e
mesmo hoje esses esforços estão sujeitos a sofrer eventual oposição
burocrática.
A natureza problemática do estágio de transição em
que vivemos, entretanto, tem causas mais profundas do que a simples
interferência burocrática. A tarefa decisiva da cultura e da arte
contemporâneas – a tarefa de representar a nova realidade através de meios de expressão
adequados a ela – está intimamente ligada a outro problema do nosso tempo: o
ingresso de milhões de pessoas na vida cultural.
Essa atitude de levar a arte a sério, o caminho que
vai da arte ao homem – o caminho para uma arte intimamente vinculada ao gênero
humano – não é o da distância mais curta entre um alto posto e uma organização
menor ou maior. É um caminho necessariamente longo, que atravessa diversas e
variadas experiências dos artistas e implica uma ampla e generosa educação
gradual dos homens.
A própria formação cultural do mundo moderno passa
por uma transformação radical, porque vivemos num outro tempo que exige outros
caminhos.
Não nos é permitido ignorar certas coisas. E o
intelecto, por ser só nosso e pertencer sempre ao nosso tempo, nos induz a ir
ao âmago das coisas para sondar o porquê e o para quê de tudo.
Daí Goethe ter dito que: “Aquilo que não compreendemos não nos pertence”.
Portanto, cultura é tudo isto: é saber, é conhecer, é
desenvolver-se; é elevar-se, moral e espiritualmente; é compreender, é amar e
até mesmo dedicar-se a uma ou mais manifestações da arte.
Cultura é o ato, o efeito ou o modo de cultivar algo
e cultivar-se a si mesmo; é o desenvolvimento intelectual e físico do
indivíduo.
Sociologicamente, cultura é ainda o sistema de
atitudes e modos de agir, em função dos costumes, das instituições, dos valores
espirituais e materiais de uma sociedade. No sentido restrito, cultura é um
desenvolvimento do estado intelectual, artístico ou científico, através do qual
se revela, com um sentido humano, um esforço coletivo pela libertação do
espírito.
Antes e acima de tudo, porém, o homem chamado ‘culto’ não é aquele que mais sabe ou
mais se dedica a um determinado estudo – e sim aquele que é civilizado; o que
procura adquirir conhecimentos abrangentes; o que respeita a individualidade
alheia; o que transcende a mediocridade do mundo; o que ama realmente o
próximo; o que contribui para um crescimento generalizado do meio em que vive e
convive; o que é manso de espírito; o que releva as injustiças; o que perdoa
aos incautos; o que dignifica o bem honesto; o que refreia e dosa as paixões
intensificadas da alma; o que distribui pacificamente o que aprendeu; o que se
porta com arrojo, mas com nobreza; o que não destrói; o que não prevarica; o
que se cala nas horas certas; o que busca a união e a harmonia do todo
universal; o que teme a Deus e verdadeiramente aplica os Seus mandamentos
divinos; o que não se apega somente à sua mísera e curta existência terrena —
numa palavra, o que concretiza ideais, pessoais ou coletivos, construindo algo
de útil, agradável e duradouro para a posteridade e deixando marcas indeléveis
no tempo, na memória e no coração da humanidade que lhe sobrevive.
“Todo homem”, diz Aristóteles, “é naturalmente desejoso de saber”; isto
é, o desejo de saber é inato; esse desejo já se manifesta na criança pelos ‘por quês?’ e os ‘como?’ que ela não cessa de formular. É ele, o desejo de saber, o
princípio das ciências, cujo fim primeiro não é o de fornecer ao homem os meios
de agir sobre a natureza, mas, inicialmente, o de satisfazer sua natural
curiosidade.
Se o desejo de saber é assim essencial ao homem, deve
ser universal no tempo e no espaço. E é isto exatamente o que nos ensina a
História. Não há povo, por mais atrasado que seja, em que não se manifeste nele
este pendor natural do espírito, que é, por sua vez, tão antigo quanto a
humanidade.
A necessidade de saber gera, de início, os chamados
conhecimentos empíricos, que são o fruto do ato espontâneo do espírito, mas
permanecem sendo conhecimentos imperfeitos, pois que lhes falta por vezes a
objetividade e se formam ao acaso, por generalização prematura, sem ordem nem
método.
Tais são, por exemplo, as receitas meteorológicas do
camponês, os provérbios e as máximas que resumem as observações correntes sobre
o homem e suas paixões, etc.
Estes conhecimentos empíricos não devem ser
desprezados. Ao contrário: eles se constituem no primeiro degrau da ciência,
que só faz por aperfeiçoar os processos que o empirismo emprega para adquirir
seus conhecimentos.
O conhecimento científico visa a substituir o
empirismo por conhecimentos certos, gerais e metódicos, isto é, por verdades
válidas para todos os casos, em todos os tempos e lugares – verdades estas
ligadas entre si por suas causas e princípios.
Cultura é, portanto, a forma universal e eterna da sabedoria,
uma vez que, considerando as causas mais altas do real e os princípios
absolutamente primeiros de todo o saber, ela domina de certa maneira o concreto
e o abstrato, o real e o irreal, o prazer e a dor, o empirismo e a praticidade,
o bem-fazer e o bem-agir, o espírito e a matéria, o ato criativo e a ação
mecânica, a tudo unificando e a tudo dirigindo para seu supremo fim comum.
Mas este conjunto de sabedorias se, por um lado,
obedece a seu próprio dinamismo, aspira, por outro, a ultrapassar-se a si mesmo;
e, desse ponto de vista, experimenta um sentimento de frustração. Porque,
apesar de toda a sua força propulsora, a cultura que o saber nos traz dependerá
sempre de uma força maior, de um efeito mais pleno, de uma luz superabundante e
supereminente a nós apenas legada por Deus, através do que comumente chamamos
de “talento”. E o talento, como fruto de uma revelação
divina, é propriamente aquele que, permanecendo constante e irrestritamente
submetido ao critério da evidência racional, admite e evoca esse conforto
subjetivo da inteligência que resulta da virtude infusa da fé e, confirmando de
cima as certezas racionais fundamentais, confere-nos uma luz e uma força
particulares, transmitindo-nos a emoção necessária e iluminando, através dos
séculos e em benefício da razão, todos os campos do saber da humanidade.
Ubá, MG, 05 de novembro de
2015.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Somos agradecidos pela visita e pela gentileza do comentário. Muito obrigado! Volte sempre.