Antonio Carlos Estevam (*) - estevam1951@gmail.com
Primeiro fomos à Wikipédia: O Celibatário (do latim cælibatus que significa "não casado") na sua definição literal é uma
pessoa que se mantém solteira, sem obrigação de manter a castidade, podendo manter
relações sexuais. No entanto, o termo é popularmente usado para descrever uma
pessoa que escolhe abster-se dessas atividades. (...)houve alguns papas casados (Adriano II, Honório IV), bispos casados (nas
dioceses da Islândia até à Reforma protestante; o bispo Salomão
Barbosa Ferraz no Brasil) e vários padres casados
ordenados nos Estados Unidos, Canadá, Austrália, Reino Unido e Escandinávia,
sob autorização especial.
Salvo engano
foi em 2010 que assisti
a um programa de reportagem investigativa, apresentado pelo competente Roberto
Cabrini da SBT: “Conexão Repórter”. Tratava-se de suspeita de pedofilia.
Infelizmente, não é novidade, nem é um caso isolado. Mas é pedofilia praticada
por padres da Igreja Católica de Arapiraca em Alagoas, comprovada com gravação
de imagens, feita por um dos ex-coroinhas. O vídeo mostra monsenhor Luiz
Marques (que negou as acusações) mantendo relações com um adolescente (coroinha
da igreja). O caso abalou a cidade e repercutiu no Brasil e no mundo. Cabrini
contou detalhes da reportagem em seu blog.
A produção do programa flagrou um
advogado identificado como Daniel Fernandes intimidando e até ameaçando os
jovens (vitimas de abusos) responsáveis pela gravação. Os garotos confirmaram ainda
que receberam R$ 32 mil reais do advogado em uma negociação intermediada pelo
Monsenhor Raimundo (outro acusado) para que não divulgassem as cenas. Após a
reportagem do “Conexão Repórter”, o Vaticano, admitiu haver pedofilia na Igreja
católica no Brasil e afastou os padres envolvidos. A CPI da pedofilia do Senado
Federal resolveu ouvir os pedófilos e abusados. O promotor
responsável pelo caso ouviu todos os envolvidos e, diante dos fatos narrados,
encaminhou o material à Polícia Civil alagoana e pediu a instauração de um
inquérito para apurar a denúncia. A investigação caberia a delegacia
especializada em crimes contra a criança.
Mediante os escândalos de
pedofilia e/ou homossexualismo envolvendo padres, ações e posturas
contraditórias à conduta de um sacerdote, pela função que ocupa e a quem se
atribui confiança, credibilidade, respeito, sobretudo porque tem a missão de
pregar os ensinamentos cristãos e propagar a palavra de Deus, uma questão
reflexiva me intriga: por que padre
não pode casar?
Li que a doutrina que proíbe o
casamento de padres (chamada celibato) foi
estabelecida na Idade Média, no ano de 1.123, período em que a Igreja detinha
forte poder de influência na sociedade. Queimava pessoas na fogueira da
Inquisição, aquelas que se opunham as idéias do clero. Era o momento em que a
força política e econômica da Igreja até superava a burguesia e os governos.
Cobravam-se indulgências e impostos dos fieis. A explicação para a proibição do
casamento dos padres, conta-se, a Igreja não queria gastar mais dinheiro, pois
com mulher e filhos seria muito mais caro bancar os padres. Se divorciasse
seriam mais gastos para os cofres da Igreja. Quando o padre morresse os bens
dele ficariam com os familiares. Assim seria prejuízo para a Igreja Romana. Um
pretexto arcaico, mantido até os dias atuais. Porém a Igreja gasta milhões com
indenizações para as famílias de crianças abusadas em sentenças de pedofilia. A diocese
católica de San Diego, no Estado americano da Califórnia, fechou acordo com
mais 144 vítimas de sacerdotes pedófilos e pagará indenizações no valor total
de US$ 198 milhões (mais de R$ 388 milhões). De onde sai esse dinheiro?
Dentre os argumentos defendidos
pelos que são a favor do celibato: os padres têm que se dedicar totalmente a
sua missão religiosa, como forma mais elevada de servir a Deus, sem ter outras
preocupações, seguindo o exemplo de Cristo, que foi celibatário. Mas segundo a
própria Bíblia, os sacerdotes podiam casar-se, já que Pedro tinha esposa
(Marcos 1, 29-30). Há ainda a
alegação de que a pedofilia também é uma pratica criminosa de indivíduos que
não são celibatários. Um argumento que não justifica. Porém há igrejas
católicas de ritos orientais, unidas ao papa, que não exigem o celibato de seus
padres. Entre essas, estão a Igreja Melquita e a Igreja Maronita. O secretário
do Vaticano tornou o assunto mais polêmico ao afirmar que a causa da pedofilia
na Igreja é o homossexualismo e não o celibato. Merece
a paciência do leitor o que a seguir desentoco de meus arquivos, transcrevendo.
Leonardo Boff, teólogo, escritor
e professor emérito da UERJ, em artigo divulgado no jornal Estadão, afirma que
os padres pedófilos envergonham os católicos. Boff defende com veemência o fim
do celibato, explica como é realizada a formação dos seminaristas em relação à
sexualidade e critica a postura conservadora, patriarcal da Igreja mantida pelo
papa Bento XVI:
“É pouco dizer que a pedofilia envergonha a Igreja. É pior.
Ela representa uma dívida impagável com aqueles menores que foram abusados sob
a capa da credibilidade e da confiança que a função de padre encarna. (...)
Sabemos como é insuficiente a educação para a integração da sexualidade no
processo de formação dos padres. Ela é feita longe do contato normal com as
mulheres, o que produz certa atrofia na construção da identidade. As ciências
da psique nos deixaram claro: o homem só amadurece sob o olhar da mulher e a
mulher sob o olhar do homem. Homem e mulher são recíprocos e complementares.
(...) O escândalo da pedofilia se constitui num sinal dos tempos
atuais. Do Vaticano II (1962-1965) aprendemos que cumpre identificar nos sinais
uma interpelação que Deus nos quer transmitir. Vejo que a interpelação vai
nesta linha: está na hora de a Igreja romano-católica fazer o que todas as
demais Igrejas fizeram: abolir o celibato imposto por lei eclesiástica e
liberá-lo para aqueles que vêem sentido nele e conseguem vivê-lo com
jovialidade e leveza de espírito. Mas essa lição não está sendo tirada pelas
autoridades romanas. Ao contrário, apesar dos escândalos, reafirmam o celibato
com mais vigor. Por que a Igreja romano-católica não dá um passo e abole a lei
do celibato? Porque é contraditório com a sua estrutura. Ela é uma instituição
total, autoritária, patriarcal e altamente hierarquizada. Ela abarca a pessoa do
nascimento à morte. O poder conferido ao papa, para uma consciência cidadã
mínima, é simplesmente tirânico. O celibato implica cooptar o sacerdote
totalmente a serviço, não da humanidade, mas desse tipo de Igreja. Ele só
deverá amar a Igreja. Enquanto essa lógica perdurar, não esperemos que a lei do
celibato seja abolida. Ele (celibato) é muito cômodo para ela (igreja).”
São milhares de padres no Brasil,
a maioria tem uma conduta ética, correta, pautada pelos princípios cristãos.
Por isso, os casos de pedofilia não podem condenar todos, toda a Igreja. Embora
seja difícil não atribuir descrédito à instituição católica...
A igreja que se renovou em alguns
aspectos, que pediu perdão à humanidade pelos seus pecados da Idade Média, que
defendeu os direitos do povo brasileiro durante a ferrenha ditadura militar,
que cumpre um papel político-social importante na sociedade através das suas
pastorais e da Campanha da Fraternidade da CNBB, fundamentada pelos princípios
de fraternidade, igualdade e solidariedade, enfrenta hoje, talvez, um dos
maiores desafios da sua história: abolir ou não o celibato?
“Se admitirmos conceber Deus como
uma forma de energia primeira, da qual emanaram todas as outras; se fizermos
nossa a idéia de que a natureza, dita
manifestação do poder criador de Deus, se
governa por si mesma; se prosseguirmos nessa linha de raciocínio...
chegaremos à conclusão de que: passar uma existência inteira a sufocar o
impulso sexual vem em flagrante agressão à ordem natural das coisas, na medida,
por exemplo, em que dá contribuição inversa para a propagação da espécie. Se
argumentos assim não bastassem, sugeriria considerar-se o quanto de benefício é
sentido, na saúde, pelos que têm atividade sexual regular. Uma transa bem
realizada, pelo menos entre um homem e uma mulher, parece elevar neles,
imediatamente, os níveis e a duração da saúde. Uma sensação de felicidade, de
harmonia do funcionamento do corpo e da mente invade todo o ser, parece que
células se reorganizam... Se entrevistarmos os celibatários ditos por opção,
havendo honestidade nas respostas decerto se concluirá que via de regra os
“votos” são dados em troca de uma suposta recompensa maior, ficando por detrás
uma eterna queixa, não livremente manifestada. A velha praxe de condenar ou
proibir atividades assim, demonizando-as em lugar de, à custa de educar, fazer
a pessoa entender que liberdade tem que ser exercida com responsabilidade, e
que expor-se é um direito que tem como contrapartida o dever de assumir os
riscos, é o que eu costumo chamar de adoção
de soluções fáceis para as coisas... —merece comentário?”, resume o professor
Tarcizio de Mauá, lido dinamicamente o acima.
(*) ANTONIO
CARLOS ESTEVAM é membro efetivo da Academia Ubaense de Letras
– AULE e seu ex-1º secretário por duas gestões. É sucessor do escritor Sílvio
Braga na cadeira no. 21, que tem por patrono o jornalista Octavio
Braga
PUBLICADO NO GAZETA REGJORNAL, EDIÇÃO DE 16/04/2012, MÊS DO DEBUT DO GAZETA (15 ANOS)
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